quinta-feira, 23 de outubro de 2014

A genética e a Restauração Florestal

Mudas de araribá em um viveiro de espécies 
nativas da Mata Atlântica.
   A restauração florestal é o processo de recuperação de um ecossistema que foi degradado ou destruído [1]. Atualmente, existem vários projetos de restauração e o número vem crescendo a cada ano. A estimativa de investimentos na restauração florestal ao redor do planeta é de 2 trilhões de dólares por ano, com uma meta de alcançar a recuperação de 150 milhões de hectares (equivalente ao tamanho do estados do Amazonas) até 2020 [2,3].

  A recuperação das florestas é uma prática considerada importante tanto por cientistas como pela população. (Leia mais aqui) Entretanto, o que nem todos sabem é que para restaurar uma floresta não adianta apenas plantar qualquer tipo de árvore, de qualquer jeito. Um exemplo de erro comum da década de 80, era plantar mudas de apenas poucas espécies pioneiras (com crescimento rápido e que toleram bem muito sol e menos água). A princípio parece uma idéia boa, porque obtém-se um resultado rápido. Entretanto, normalmente essas plantas têm naturalmente uma vida curta e não toleram ambientes mais sombreados, como é uma mata mais madura. Então, após 10 a 15 anos, a maioria das plantas morre e não há regeneração (Leia mais aqui)[6].

   Existem vários pesquisadores que estudam qual a melhor maneira de realizar uma restauração florestal para que as florestas possam se manter saudáveis a longo prazo. Eles consideram quais espécies devem compor a mata, como atrair animais e usam até ferramentas de genética para esse fim (saiba mais lendo o Box abaixo). Conhecendo essas informações, eles podem criar planos de restauração que necessitem de menos ações de manejo (plantar mais mudar, podar trepadeiras, etc.) ao longo dos anos e que permitam obter uma floresta que se sustente por muito tempo.

Box. Como a genética ajuda na restauração florestal 
Onde coletar sementes para restauração?
É importante compreender do quão diferentes são os organismos de cada local. Por exemplo, é possível identificar se as plantas de uma mata de onde se coleta sementes são diferentes das plantas de outra mata. Com as novas técnicas de estudo da genética dos organismos, são geradas informações que permitem identificar locais bons para coletar sementes para cada área de restauração de forma a evitar problemas de adaptação ao local de plantio. Também é possível identificar fontes de sementes que possam responder às mudanças climáticas, utilizando projeções futuras do clima [4].


2. Como plantar as mudas? 
É possível analisar como as plantas de uma área se relacionam, ou seja, se existe uma estrutura familiar entre indivíduos próximos. Isso permite planejar de forma mais adequada como distribuir as mudas ao longo da área de restauração [5].

    Apenas alguns municípios no país possuem viveiros de mudas de espécies nativas locais, então para realizar a restauração florestal onde não há um viveiro é necessário importar mudas de outras regiões. Uma dificuldade é que que, às vezes, o local de onde as sementes vêm não possui o mesmo clima ou o mesmo tipo de vegetação que a área onde as mudas serão plantadas. Informações genéticas podem nos ajudar a compreender se as plantas de onde são obtidas as sementes para restauração são adaptadas ao ambiente onde as mudas serão plantadas. Além disso, essas informações também permitem medir a capacidade das mudas formarem populações estáveis ao longo do tempo.

    Há mais de 20 anos, métodos de estudo da genética de plantas, animais e micro-organismos vêm sendo usados para subsidiar a recuperação de florestas. As novas técnicas de leitura das sequências de DNA permitem obter o genoma completo de um organismo em semanas, diferentemente das técnicas mais antigas que exigiam anos para obtenção dessa informação. Também é possível analisar milhares de pontos do DNA de centenas de indivíduos simultaneamente. Antigamente, só era possível obter tamanha quantidade de informação de espécies chamadas modelo por serem muito estudadas, como no caso dos humanos (nos quais se investe muito dinheiro) e da Arabidopsis thaliana, uma plantinha da família da couve (que é um organismo mais simples). Com essas novas técnicas, é possível estudar espécies nativas, sem muito conhecimento prévio, com custo muito reduzido. 

Desafios
    Um dos principais desafios do uso da genética para restauração é compreender a grande complexidade do genoma de algumas espécies. Essa complexidade é gerada naturalmente ao longo da história evolutiva de algumas espécies. Outro desafio é a capacidade limitada de processamento de dados. As novas tecnologias de geração de informações genéticas produzem quantidades enormes de dados. Essas análises demandam tempo, grande capacidade computacional e profissionais capacitados. Também é necessário compreender melhor como os dados obtidos se encaixam nas teoria existentes, para tirar conclusões seguras. Esses estudos estão sendo desenvolvidos continuamente nas mais diversas instituições de pesquisa espalhadas pelo mundo (Descubra mais sobre elas aqui) [7].     


Patricia Sanae Sujii
Fale com a pesquisadora: sujiips@gmail.com

Referências: 
[1] Society for Ecological Restoration (2004) SER International Primer on Ecological Restoration, Society for Ecological Restoration
[2] Cunningham,S.(2008) ReWealth!: StakeYour Claimin the $ 2 Trillion Development Trend That’s Renewing the World. McGraw-Hill
[3] International Union for Conservation of Nature (IUCN)
[4] Byrne, M. et al. (2013) Adaptation to Climate in Widespread Eucalypt Species, National Climate Change Adaptation Research Facility
[5] Mosner, E. et al. (2012) Floodplain willows in fragmented river landscapes: understanding spatio-temporal genetic patterns as basis for restoration plantings. Biol. Conserv. 153, 211–218
[6] Rodrigues, R. R., Lima, R. A., Gandolfi, S., & Nave, A. G. (2009). On the restoration of high diversity forests: 30 years of experience in the Brazilian Atlantic Forest. Biological Conservation, 142(6), 1242-1251.

[7] Williams, A. V. et al. (2014) Next generation restoration genetics: applic’tions and opportunities. Trends in Plant Science. in press.

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